O corpo está aqui, fora de campo

A explosão do porto de Beirute, a 4 de agosto de 2020, foi um acontecimento global e afetou toda a cidade num instante, ao contrário de episódios de violência anteriores, como a série de carros armadilhados e a guerra de 2006, que foram acontecimentos localizados. O evento tornou clara uma mudança na política libanesa, em direção a um estado de paz corrompida, a uma política de colapso total e degradação entrópica. Apesar do seu impacto, o acontecimento não trouxe mudança política, nem demissões, nem reparações, nem justiça. Como resultado, velocidades desarticuladas de existência convivem num mesmo local – as famílias das vítimas esperam no limbo por uma justiça que não vem; aqueles que sobreviveram ao evento foram para as ruas com vassouras para limpar e seguir em frente.

Esta performance é uma tentativa de ficar com o presente fixo do acontecimento e injetar-lhe tempo. Em palco, uma performer relaciona-se, através de imagens e sons, com o seu duplo, imóvel num ecrã. Todos os elementos da peça pretendem convergir para um estado de transe imóvel – o estado daqueles que vivem em proximidade com a iminência do desastre.